Você já reparou como o sistema de justiça trata diferente quem é diferente?

Mulheres que cometem crimes raramente são julgadas só pelo que fizeram. Elas também são julgadas por não agirem como a sociedade espera de uma “boa mulher”. Se não demonstram arrependimento, se não falam dos filhos, se não se mostram frágeis… a pena costuma pesar mais.

Isso não é exagero. É o que a criminologia feminista vem mostrando há décadas. Essa linha de pensamento pergunta: será que o direito penal, além de seletivo, também é sexista?

Ser mulher no processo penal não é neutro

O sistema jurídico foi feito por homens, com base em um modelo masculino de sujeito. Quando uma mulher entra nesse sistema como ré, tudo nela é observado: sua postura, sua roupa, sua vida afetiva.

Se ela é mãe, a pergunta é: onde estavam os filhos quando ela cometeu o crime? Se não é, por que não quis ser mãe?

“As mulheres são julgadas não apenas por seus atos, mas por não se conformarem ao que se espera de uma mulher.”
– Carol Smart

Quem são essas mulheres?

A maioria das mulheres presas no Brasil responde por crimes sem violência, como furto ou tráfico. Muitas cometeram esses atos em situações de vulnerabilidade: violência doméstica, pobreza, coação de parceiros. Mas o sistema penal costuma ignorar isso.

Na prática, o que acontece é o seguinte: a justiça penal pune a mulher pela conduta e pela condição.

Prisões que não resolvem nada

O cárcere não resolve o conflito. Só esconde. E quem mais sofre nesse esconderijo são as mulheres negras, pobres, periféricas, abandonadas até pela política pública.

“As prisões não desaparecem os problemas sociais. Elas desaparecem pessoas.”
– Angela Davis

Justiça para quem?

Quando um homem branco, rico, comete um crime, o Judiciário fala de garantias. Quando é uma mulher negra da periferia, fala de “exemplo” e “repressão”.

O problema não está só na lei. Está em como, contra quem e por que ela é aplicada.

“O patriarcado estrutura todas as esferas, inclusive quem merece punição e quem merece cuidado.”
– bell hooks

Isso não é exceção. É estrutura

A criminologia feminista não quer justificar crime. Ela quer mostrar que o sistema penal funciona como uma máquina de punir quem já está à margem.

Ser mulher dentro do sistema penal é ter menos escuta, menos compreensão e mais julgamento moral.

“A seletividade penal não é uma falha. É um projeto.”
– Vera Malaguti Batista

Por que isso importa?

Porque sem enxergar essas desigualdades, a gente continua chamando de justiça algo que, na prática, reproduz exclusão e violência.

A criminologia feminista não é “mimimi”. É crítica séria, feita com base, com estudo, com vivência. E ela é fundamental pra quem acredita num direito penal que seja menos punitivo e mais comprometido com dignidade.

Referências

  • DAVIS, Angela. Are Prisons Obsolete? Seven Stories Press, 2003.
  • SMART, Carol. Women, Crime and Criminology. Routledge, 1976.
  • HOOKS, bell. O feminismo é para todo mundo. Rosa dos Tempos, 2018.
  • BATISTA, Vera Malaguti. Introdução Crítica à Criminologia Brasileira. Revan, 2011.